O Mundo aos nossos olhos.

O Mundo aos nossos olhos.

Por André Luis Cotrin Lima

Sempre achei que fosse normal a minha forma de ver o mundo, digo ver de forma a imaginar as coisas, não de forma literal.
Quando imaginava algo em minha cabeça, imaginava formas, não palavras, como descobri que grande parte das pessoas veem.
Bem, resumirei um pouco da história pra vocês.

Sou pai de uma linda menina de olhos azuis esverdeados (é, está ficando verde igual ao meu), loirinha de cabelos cacheados, uma princesa que encanta a todos. Ela nasceu há 3 anos atrás. Com um ano e meio minha esposa começou a se preocupar com ela por alguns motivos: não pronunciava quase nenhuma palavra, mantinha pouco contato visual e quando queria algo não pedia, apenas colocava o dedo na boca e ficava quieta, nem ao menos apontava o que queria.

Levamos à fonoaudióloga, pra vermos se seria problema com a fala, foi quando ela disse na lata que nossa filha era Autista.
Ficamos irritados, queria ir até o consultório tirar satisfação com ela, mas minha esposa em sua maravilhosa sabedoria soube fazer com que eu mantivesse o controle. Depois ouvimos muitas pessoas ligadas direta e indiretamente ao assunto, médicos, alguns professores...

Muitos disseram ser a audição, sendo essa hipótese a que mais nos deixava tranquilo, pois o que mais nos preocupava é que ela não falava, apenas algumas pequenas palavras simples como (esse, não, dá, aqui, mamã, papá), mas às vezes passava muitos dias, até meses, sem repeti-la.

Tentava tranquilizar minha esposa, dizendo para não se preocupar com isso, pois eu só fui falar aos quatro anos e isso é normal, uma hora ela começa a falar, mas mesmo assim, fizemos o exame pra audição (BERA), que diagnosticou uma perda mínima.

Colocamos o aparelho, mas mesmo assim, pouco se comunicava, começou a fazer tratamento Fonoaudiológico, Psicológico e a frequentar a escola, que graças a Deus é da minha família.
Minha filha continuou passando com frequência na Neuropediatra, que pedia exames para concluir o diagnóstico. Após um ano, ela concluiu o diagnóstico, realmente era Autismo. Segundo a Neurologista era leve, não era nada de muito grave, mas tinha sim.

Minha esposa ao saber da notícia, ficou preocupada com situação de um futuro pra nossa filha, mas eu consegui manter a calma e tentar tranquiliza-la. Marcamos outros Neuros, que deram diagnósticos praticamente iguais, com algumas ressalvas, sendo uma dessas ressalvas pra nós fazermos tudo o que tem que ser feito em relação a ela, pra que ela possa ter uma vida normal, e quanto ao fato dela não falar, ainda temos a chance de reverter esse quadro até mais ou menos os 6 anos de idade, com ajuda da Psicóloga Comportamental.

Bem, devido a tudo isso, eu comecei a perceber que tinha muitas coisas da minha filha que batiam direto comigo e resolvi fazer um teste de autismo na internet. Um não, uns quatro. Dois deram autismo leve e dois Asperger. O curioso é que dois dos neuros, fazendo perguntas pra mim, também disseram que eu era Autista, um disse Asperger e outro autismo leve.

Eu, como disse antes, demorei a falar, imagino imagens em lugar de letras, não preciso do contato visual pra entender o que as pessoas estão falando, mas quero que elas me olhem quando eu falo com elas, e isso eu percebo muito em minha filha, quando ela quer alguma coisa como uma bolacha ela puxa em minhas mãos até o armário, não diz nada, às vezes balbucia alguma coisa em seu linguajar, mas olha só por um instante pra mim.

Voltando a mim, eu era tímido, cheguei a repetir alguns anos na escola por timidez, pois tinha vergonha de perguntar ao professor e isso acabava me prejudicando. Adorava matérias humanas e odiava exatas, tanto que passei em segundo lugar no vestibular de História e em décimo quinto em Jornalismo, mas optei por Jornalismo.

Não consigo ficar muito tempo em um lugar só, estou sempre mexendo a perna ou balançando o corpo de um lado pro outro, coisas que pensasse que fosse somente um cacoete. Às vezes prefiro estar sozinho, mas não quero ficar sozinho. Barulho me irrita, digo muitas pessoas falando.

E sou muito pontual, aceito até 10 minutos de atraso, passou disso, fico bravo.

Minha imaginação vai além daquilo que eu possa querer e ter, poucas coisas prendem a minha atenção, como cozinhar e música, são como terapias pra mim. Quando tiro foto, tem que ser várias, porque dificilmente eu olho pra câmera.

Vejo o mundo de uma forma mais abrangente, pra mim tudo tem mais do que um caminho a ser seguido, tudo tem vários leques e respostas e sei que pra minha filha também será assim.
Sempre pensei que fizesse parte dos ditos "normais", mas descobri que não. Mas isso não me deixou preocupado, muito pelo contrário, me deixou feliz, pois, com tudo isso, eu trabalho, tenho amigos, sou pai de uma linda princesinha e marido de uma linda e maravilhosa mulher! Coisas que muitas pessoas "normais" não conseguiram fazer.

O Mundo aos nossos olhos é um mundo em que os porquês não têm que ser uma simples resposta e assim algo que a gente entenda de forma detalhada, um mundo em que um simples "talvez" ou "sei lá" nos deixa muito mais chateados do que um direto "não".

Não fiquei preocupado com o diagnóstico médico, pois muitas pessoas têm o Espectro do Autismo e muitas dessas pessoas se deram muito bem na vida, tendo nessa lista muitos famosos, basta pesquisar e vocês vão ver.

Bem, se muitas das pessoas que se dizem "normais", vissem o mundo com nossos olhos, tenho certeza de que o mundo seria muito melhor.